domingo, agosto 14, 2011

Day 5: A book that makes you laugh



Edwin de Valu puxou o primeiro original de cima da pilha. Logo à mão havia um monte de cartas de recusa, prontas para serem enviadas. "Olá, mr. Jones" (Jones era o nome que eles inventaram para o responsável pelos originais). "Olá, mr. Jones! Escrevi um romance de ficção sobre -" e foi só até aí que Edwin chegou.

Em nome da Panderic Inc., eu gostaria de agradecer a interessante proposta que nos enviou. Infelizmente, após cuidadosa consideração...

Edwin pegou o manuscrito seguinte. "Prezado mr. Jones; segue anexo o meu romance As luas de Thoxth-Aqogxnir. Esta é a primeira parte de uma trilogia que..."

... e muito debate editorial, concluímos que, lamentavelmente, seu livro não corresponde às nossas necessidades editoriais do momento.

[...] "Prezados senhores: Como sabemos pouco sobre a manutenção e o conserto de geladeiras e, não obstante, como é longa e fascinante a história que esse campo apresenta."

Já pensou em submeter seu manuscrito à HarperCollins ou talvez à Random House?

...

Mr. Mead tinha falado sobre a lacuna inesperada no catálogo de outono. Fazia seis ou sete anos que todo mês de outubro a Panderic publicava um livro de um médico da Geórgia que atendia pelo nome de mr. Ethics: O guia de ética para todos um ano, Uma introdução à ética para o gerente moderno no outro, Como viver uma vida ética neste nosso mundo maluco e confuso no ano seguinte. [...] Infelizmente, algumas semanas antes mr. Ethics fora pego pela Receita Federal sob a acusação de sonegação fiscal e agora podia cumprir uma pena de oito a dez anos de prisão. [...] Toda a linha de livros de auto-ajuda de mr. Ethics fora suspensa. [...]
"Você não soube? Mr. Ethics foi condenado a três sentenças consecutivas de prisão perpétua."
"O quê? Por evasão fiscal?"
"Não. É que encontraram no quintal dele os corpos dos últimos três auditores da Receita Federal que tinham ido procurá-lo."
[...] "Ah, bem feito. O homem foi um idiota. Todo mundo sabe que a gente não enterra os cadáveres no quintal de casa. É o primeiro lugar onde vão procurar."

...

Edwin tirou o sobretudo. Tirou a gravata. Olhou-se no espelho do corredor da entrada, o rosto macilento, os olhos dois buracos abertos como brasas em linóleo barato. "Eu devia mesmo era ser escritor", pensou. "Tenho jeito para comparações".
Estava tão concentrado em suas feições abatidas, tão fascinado, numa inversão de narcisismo, que por pouco não viu o quadrado de papel amarelo preso no canto inferior do espelho. Era um post-it e dizia: "Ânimo! Você está melhor do que imagina".
Que po...
"Olá, meu bem! Chegou mais cedo!". A esposa atravessou o saguão aos pulos, vindo da cozinha e voltando para a sala, um lampejo de lycra púrpura e rosa. Ao fundo, baixinho, ouvia-se uma toada mesmerizadora: "E um e dois e três. Vamos queimar isso, vamos queimar isso". [...]
Avançando pelo corredor, Edwin foi vendo mais e mais quadrados de papel amarelo, um desfile de mensagens motivadoras. "Lembre-se: você é tão bom quanto diz que é! Melhor até!" "Saber viver é o primeiro passo para aprender a amar." "Sim, você pode! Sim, você vai conseguir!"
Que po...
Agarrou um pedaço de papel onde, numa letra jovial, estava escrito: "Você se lembrou de me abraçar hoje?" [...] Havia post-its por toda parte: na cozinha, na sala de jantar até, evidentemente, no banheiro. Estavam no abajur ("Consumo de energia! Pense no planeta, grande e azul!"), acima da máquina de lavar louça ("Pratos limpos! Mente limpa!") e na porta da geladeira ("Mais saúde e um corpo mais bonito"). [...] Edwin abriu a porta da geladeira e enfiou a mão para pegar uma lata de cerveja. Na lata - em cada lata - havia um lembretezinho de Jenni: "Tem certeza de que precisa desta cerveja? Tem certeza mesmo? Parece que alguém tem bebido muito ultimamente." [...]
Mais cedo, depois de Edwin tomar um banho e fazer a barba, Jenni o convidara a (a) fazer amor; (b) fazer sexo; ou (c) ter relações conjugais. Como sempre, fora previsível, sem inspiração e levemente decepcionante. O que equivale a dizer que a resposta foi (c). Em determinado ponto dos procedimentos, no auge da paixão morna [...], com o rosto enfiado entre as pernas dela, ele encontrou, preso do lado de dentro das coxas, um post-it que dizia: "Lembre, círculos pequenos e não muita pressão direta!"

Ser Feliz
Will Ferguson - tradução de Manuel Paulo Ferreira
Companhia das Letras, 2003

Um comentário:

anna v. disse...

Este livro também me fez rir bastante, mas acho que ele muito mais efetivo com quem já trabalhou no mercado editorial e passou pelo drama da "slush pile".
Abraços.