sábado, agosto 27, 2011

Day 18: A book no one would expect you to love



Certo dia, o presidente Roosevelt disse-me que estava pedindo sugestões, publicamente, sobre como se deveria chamar esta guerra. Retruquei de pronto: "a Guerra Desnecessária." Nunca houve guerra mais fácil de impedir do que esta que acaba de destroçar o que restava do mundo após o conflito anterior.

A Insânia dos Vencedores, 1919-1929

Após o término da Guerra Mundial de 1914, imperou profunda convicção e uma esperança quase universal de que reinaria a paz no mundo. Esse ardente desejo de todos os povos poderia ter sido facilmente satisfeito houvera firmeza nas convicções justas e um bom senso e uma prudência razoáveis. A expressão "a guerra para acabar com as guerras" estava em todas as bocas, e se haviam tomado providências para torná-la realidade. O presidente Wilson – presumiu-se que com a autoridade dos Estados Unidos – fixara em todas as mentes o conceito de uma Liga das Nações. Os exércitos aliados estacionavam ao longo do Reno e suas cabeçasde-ponte projetavam-se a fundo numa Alemanha derrotada, desarmada e faminta. Em Paris, os chefes das nações vitoriosas debatiam e discutiam o futuro. Diante deles abria-se o mapa da Europa, a ser redesenhado praticamente conforme bem entendessem. Após cinqüenta e dois meses de agonia e riscos, a coalizão teutônica lhes estava aos pés, e nenhum dos seus quatro membros era capaz de opor a menor resistência à vontade dos vitoriosos. A Alemanha, líder e frente da agressão, vista por todos como causa primordial da catástrofe que se abatera sobre o mundo, estava à mercê ou ao critério dos vencedores, eles mesmos cambaleantes depois da tormenta por que haviam passado. Além do mais, não fora uma guerra de governos, mas de povos. Toda a energia vital dos maiores países escoara-se aos borbotões na ira e na matança.

Os líderes guerreiros que se reuniram para a paz em Paris, no verão de 1919, para lá tinham sido levados pela mais forte e furiosa maré que jamais montou na história humana. Já ia longe o tempo dos tratados de Utrecht e de Viena, quando estadistas e diplomatas aristocráticos, vencedores e vencidos, reuniam-se numa discussão polida e cortês e, livres do clamor e da babel da democracia, podiam reformular sistemas com base nos princípios fundamentais com que todos concordavam. Os povos, exaltados por seu sofrimento e pelos grandes ensinamentos que este lhes tinha imposto, ali estavam em volta, aos milhões, a exigir que a compensação fosse plenamente extorquida. Desgraçados dos líderes, agora montados em seus inebriantes pináculos de triunfo, se pusessem a perder na mesa de conferência o que os soldados haviam conquistado em cem campos de batalha encharcados de sangue.

A França, por direito advindo de seus esforços e suas perdas, ocupava o papel principal. Quase um milhão e meio de franceses pereceram em defesa do solo pátrio sobre o qual haviam resistido ao invasor. Por cinco vezes em cem anos – em 1814, 1815, 1870, 1914 e 1918 – as torres de Notre Dame tinham visto o clarão dos canhões prussianos e ouvido o estrondo de seus disparos. Agora, por quatro anos medonhos, treze províncias da França haviam ficado sob o jugo rigoroso do comando militar prussiano. Extensas regiões foram sistematicamente devastadas pelo inimigo ou pulverizadas no confronto entre os exércitos. [...] Por quase cinqüenta anos, eles tinham vivido em meio ao terror das armas alemãs. Agora, ao preço de seu próprio sangue, essa longa opressão fora empurrada para longe. Sem dúvida, ali tinham chegado, finalmente, a paz e a segurança. Num ímpeto apaixonado, o povo francês exclamava: “Nunca mais!”

Mas o futuro vinha carregado de maus presságios. [...] A Alemanha havia combatido quase o mundo inteiro, quase sozinha, e quase vencera. [...] Desgastada e duplamente dizimada, mas indiscutível senhora do momento, a nação francesa perscrutava o futuro com um grato assombro e um medo obsedante. Onde estava, afinal, aquela SEGURANÇA sem a qual tudo o que fora conquistado parecia sem valor, e a própria vida, mesmo em meio ao júbilo da vitória, era quase insuportável? A necessidade extrema era a segurança, a qualquer preço e por qualquer meio, por mais severo ou até implacável que fosse.

No Dia do Armistício, os exércitos alemães haviam marchado em ordem para casa. "Eles souberam lutar", disse o marechal Foch, generalíssimo dos aliados, com os louros rebrilhando sobre a fronte e falando com espírito de soldado: "Que conservem suas armas." Mas exigiu que a fronteira francesa, dali por diante, fosse o rio Reno. A Alemanha podia estar desarmada; com seu sistema militar em frangalhos; com suas fortalezas desmanteladas; podia estar empobrecida; sobrecarregada com o peso de indenizações incomensuráveis; podia tornar-se presa de rixas internas; mas, em dez ou vinte anos, tudo isso passaria. O indestrutível poderio “de todas as tribos germânicas” se ergueria uma vez mais, e as fogueiras latentes da Prússia guerreira tornariam a arder e brilhar.

Mas o Reno, o largo e profundo Reno, com sua correnteza veloz, uma vez mantido e fortificado pelo exército francês, seria uma barreira e a proteção por trás da qual a França poderia viver e respirar durante gerações. Muito diferentes eram os sentimentos e opiniões do mundo de língua inglesa, sem cujo auxílio a França certamente teria sucumbido. As disposições territoriais do Tratado de Versalhes deixaram a Alemanha praticamente intacta. Continuou a ser o maior bloco racial homogêneo da Europa.

Quando o marechal Foch tomou conhecimento da assinatura do Tratado de Paz de Versalhes, comentou com singular agudeza: "Isso não é Paz. É um Armistício de vinte anos."

Memórias da Segunda Guerra Mundial
Winston Churchill - Tradução de Vera Ribeiro­
Editora Nova Fronteira, 2005

2 comentários:

anna v. disse...

Suzana, eu também amei este livro, está entre os meus favoritos de Segunda Guerra. Que tremendo escritor foi o Churchill, né?

Suzana Elvas disse...

Maravilhoso. E eu descobri, meses depois de ter comprado esse livro, que meu avô (que foi da Aeronáutica) tinha os seis volumes originais, em inglês (esta versão foi condensada), que estão agora na minha estante.