Ser Homo implica ser não somente sapiens mas igualmente demens: em manifestar uma afetividade extrema, compulsiva, com paixões, cóleras, gritos, mudanças brutais de humor; em carregar consigo uma fonte permanente de delírio; em crer na virtude de sacrifícios sanguinolentos, e dar corpo, existência e poder a mitos e deuses de sua imaginação. Há no ser humano um foco permanente de Ubris, a desmesura dos gregos. [...]
A boca não se limita somente ao que se come, absorve, dá (lamber, salivar). É também a via de passagem da respiração, que corresponde a uma concepção antropológica da alma. O beijo na boca, que o Ocidente popularizou e globalizou, concentra e concretiza o singular encontro de todos os poderes biológicos, eróticos e mitológicos da boca. De um lado, ele é um analogon da união física e, de outro, representa a fusão de duas respirações, que é também uma fusão de almas.
A boca é algo verdadeiramente extraordinário, algo aberto para o mitológico e o fisiológico. Esquecemos que esta boca fala, e o que há de muito belo é que as palavras de amor são seguidas de silêncios de amor.
Edgar Morin, "Amor, poesia, sabedoria"
Bertrand Brasil, 1998
sexta-feira, maio 06, 2005
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