No meu emprego antigo, uma das coisas de que eu mais gostava era observar as pessoas que eu via na rua, da janela do ônibus. A viagem demorava uma hora - tempo para ler, cochilar, espiar, espionar.
Como da vez em que entrou um senhor - devia ter uns 70 anos - sentou-se na janela e começou a desfiar o repertório do Silvio Caldas. Um mal-educado gritou lá do fundo "Cala a boca, velho!" e o trocador, um armário (baixo, tudo bem, uma sapateira robusta), foi lá trás tomar satisfação. O cara botou a viola no saco e Silvio Caldas prosseguiu cantando sem acompanhamento.
Hoje, levo menos de dez minutos da escola das meninas para o trabalho. Quando vou almoçar (a empresa fica num prédio de escritórios, em cima de um shopping) vejo aquela multidão tão igual, falando no celular, comprando, batendo os saltos no granito preto ou andando de óculos escuros pelos corredores.
Saudades de tudo o que eu aprendi naquelas viagens intermináveis. Saudades de quando eu vi, jogando bola debaixo de uma chuva torrencial, num canteiro da Avenida Presidente Vargas, um moleque maltrapilho, magrela, imundo - mas de cabelo esplendorosamente azul.
quinta-feira, junho 09, 2005
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