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"Mas você se corresponde com gente famosa?" Sim, às vezes. Faz parte do meu trabalho. Algumas famosas, outras nem tanto, algumas muuuuito famosas, outras despontando para o anonimato.
Faz um tempinho, entrei em alguns fóruns de um cantor americano muito famoso. Eu adoro a voz dele, adoro as músicas que ele fez. São únicas. E fico absolutamente passada quando me deparo com temas como "O que você faria com Fulano no Dia dos Namorados". Como assim? Pois você ama o homem? Mas você nem CONHECE o homem! E aí tem declarações de amor rasgadérrimas, constrangedoras, às vezes resvalando no mau gosto (e o pobre já deu mostras que O-DEI-A isso).
Quem sou eu pra criticar? Bom, quando eu comecei a trabalhar em jornal, fui um dia entrevistar Paulo Autran, que ia fazer apresentação única de seu shakespeareano "A tempestade" aqui no Rio, no então Metropolitan. Fiz a entrevista e, obviamente, fiquei para apresentação. Depois, fui à festa, cheia de starlets & imprensa & famosos. E aí conheci um ator que, confesso, sempre foi lindo de babar. Conversa daqui, conversa dali, ele me chamou pra sair. Marcamos e, no dia, eu vi que fama e beleza, senhoras e senhores, mata qualquer deslumbramento.
Ah, sim, eu estava deslumbradérrima. Mas logo depois de ele parar em lugar proibido, humilhar o flanelinha, furar a gigantesca fila do restaurante, passar a noite se achando a bala que matou Kennedy (de tédio) e criar encrenca por causa de R$ 0,50 na conta (que ele tentou empurrar como cortesia na base do "Fulano está aí?"), eu vi que não, não é bem assim.
Porque você diz: "Ai, eu amo o Beltrano!". E faz declarações de amor como se o homem fosse aquela pessoa que esteve com você a vida inteira - o que não é, absolutamente, verdade. Conheço atrizes mentirosas compulsivas; grandes cantores que surravam sistematicamente suas mulheres; escritores que humilham publicamente seus filhos. E, mesmo assim, todos são alvo de amor incondicional. Gente histérica chorando e se desmanchando quando o dito aparece "casualmente" para o grupo de fãs à espera dele na porta do teatro.
Sim, eu baixei todos os vídeos e músicas dele e da banda com que ele cantava antes da carreira solo. Sim, eu adoraria encontrar com ele. Ele me conhece? Não; então como pode me amar? E eu, como posso amar alguém que não sei se é encantador com idosos ou rói as unhas, deixa sua roupa suja pela casa ou limpa as migalhas de pão da mesa? É mesquinho, come do prato dos outros sem pedir e abomina crianças - ou faz parte dos 0,0000726% dos homens inesquecíveis ainda existentes sobre a face da Terra?
Aprecio as músicas, admiro o trabalho, adoro a voz. Mas amar o homem?
Update: Mas que gente curiosa!
7 comentários:
na mosca. e maravilhoso, as usual. bjs
...e um dia você vai me contar quem é essa figura. ah, vai sim...
po, sacanagem! eu tb fiquei curiosa!
e os 0,0000726% de homens inesquecíveis? vc foi generosa! é muito menos, bobinha!
Eu quero dois nomes: o do ator babaca e o do cantor cujo trabalho você curte. ;)
Ah, eu ficaria bastante contente só de saber quem é o cantor que você gosta :) É claro, que se eu soubesse quem era o ator ficaria mais contente ainda :P ahhahahaha
Beijocas :)
Confesso que curto fantasiar essas figuras. E graças que, por mais de uma vez, já tive a chance de ver com meus próprios olhinhos (que a terra há de comer) que a realidade é *outra* coisa :D
(Sei que você é muuuuuito elegante pra declinar o nome dos mancebos, mas que fiquei curiosa, fiquei.)
Beijocas
Acho praticamente impossível a verdadeira imagem de alguém "público" corresponder ao que, nós, meros mortais, imaginamos (ou forjamos) quando admiramos o trabalho desta pessoa — sobretudo quando não a conhecemos de perto. Por isso, não acredito que se possa “amar” alguém apenas pela imagem (quase sempre ilusória) que temos dele, mas não duvido que exista gente que pense o contrário.
Ator, cantor, escritor, etc e tal podem, sim, ser estimados pelo trabalho que realizam, mas isso não significa necessariamente que sejam "seres humanos exemplares". E é esta confusão que, muitas vezes, decepciona certas pessoas (inclusive fãs). O que não significa também que apenas por não serem "exemplos de humanidade" o trabalho bem realizado destas pessoas perca seu valor.
Acredito que a questão da “imagem” para os que vivem dela tem de ser encarada como uma espécie de negócio: há sempre uma série de cuidados para que ela seja agradável, boa e positiva, e é inegável que isso mascara muito da verdade de quem está atrás dessa “construção”. O choque parece maior quando a máscara cai no caso de alguém “famoso” porque o poder dessa imagem fictícia geralmente também é grande. Por outro lado, nós, mortais, também forjamos máscaras para nós mesmos (ainda que apenas visando alguma proteção). Podem até me apedrejar, mas acredito que TODOS exibem não a sua verdadeira imagem, mas a que gostariam que os outros vissem.
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