quarta-feira, setembro 23, 2009

Câmara clara*



Você pode trepar, transar e fazer amor. As duas primeiras requerem apenas conhecimento técnico. Mas a terceira requer algo mais.
Fazer amor é, antes de tudo, conhecer. O jeito de acender o cigarro, a maneira de inclinar a cabeça quando pensa. Os olhos ficam ligeiramente avermelhados quando bate o tesão? Se entrefecham? Há urgência nas mãos? Sim, há de se reparar em todos os detalhes.
Na hora, não se deve pensar muito. É instintivo. Mas também é a maneira de abraçar que faz o coração bater loucamente, sentindo que o desejo cresce e força passagem. As pernas não deixam, prendem o que quer se libertar. Tateia, tenta escapar, encontrar a saída por onde tanto deseja entrar.
Arquear as ancas (sabe o que são as ancas? A parte mais escandalosa, a que mostra à platéia se você está agradando). Passear as mãos pelo corpo, como se procurasse algo, mas feliz por apenas escorregar na pele lisa, sedosa, que se arrepia ao menor toque, seja ele agressivo ou diáfano. E então começa a luta, de uma violência que parece mostrar que ali não há amor, quando amor é o que mais há. "Por favor, não faz isso." Amante é tradutor universal. Isso quer dizer "Vem, eu preciso tanto de você." Escorrega-se, lenta e dolorosamente, para dentro, para um mundo onde minutos podem ser horas e vice-versa. Delicadamente, mas com firmeza. As bocas que se juntam num desencontro que parece não ter fim. Por que não acertam o passo? Porque há mais para acertar. O prazer vem do desacerto, das palavras que não dizem o que querem dizer. Tudo é ao contrário, a dor vira prazer, o prazer é tudo o que há.
As línguas que bebem o suor a escorrer da nuca, a descer pelos ombros. Mãos que buscam embaixo de corpos o que desesperadamente pede para ser tocado – mas que foge ao sentir o toque. Um púbis a escorregar pelas costas, costas a se chocar com pernas. Cabeças a subir por joelhos que não sabem se a ordem é encontro ou separação. Fazer amor é sentir os nós dos dedos dele na palma das mãos, o queixo nas espátulas, o roçar da barba por fazer, o hálito que se procura desesperadamente, como um guia no meio de um nevoeiro.

Fazer amor é, ao final, acariciar sobrancelhas, rosto, mãos. É escutar o ressonar satisfeito, como o de um gato. É ouvir urgência na pergunta: "Aonde você vai?" e tranqüilizar com um "Só beber um copo d'água".

* É por isso, moço.

4 comentários:

Unknown disse...

Vou levar este texto comigo para sempre!! Obrigada pela inspiração e por ter clareado algumas idéias, minha queridona!

Goiabada disse...

Eu lembro desse texto.
E estámos esperando os doces.
Ks
Will

cris disse...

suzana, o texto é seu? essa lindeza é de sua autoria? olha, o texto mais lindo que já li sobre essa temática nos últimos tempos. posso divulgar? bjs

p.s: ah. tua vida tá monótona pq vc quer. acabei a tese, me chama pra sair!!! =)

venus in furs disse...

amei,senti.
quando a gente sabe o que é isso,é ainda mais gostoso,não só as palavras,mas a sensação.pena que pra mim são só lembranças,pois quele que tem o meu 'fazer amor' está longe.