"Na
semana passada, limpei o quarto da Cal. Era a faxina da primavera, mas
significou muito mais - mais do que apenas uma mudança de estação. Foi
como um ritual. Arrumei uma enorme caixa de brinquedos e fraldas para
doar à Creche St. John. Tentei não me importar muito ao separar os
brinquedos praticamente novos que eu doaria para a escola. Como minha
mãe, meu sentimentalismo jamais ultrapassa o pragmatismo. Há algo pecaminoso sobre brinquedos e roupas juntando poeira, quando poderiam ser úteis a outras pessoas.
[ ...]
Cal está morrendo; eu agora posso dizer isso e fazer planos para além desse momento. Tenho pensado sobre as escolhas que fizemos antes e discutido o que sinto sobre elas. Pat e eu tivemos uma conversa sobre o que está por vir e usamos a palavra começada por "m" para descrever o que está acontecendo. Pode-se imaginar que Pat e eu falamos sobre a morte de Cal às vezes, mas não. Consigo dizer a estranhos no telefone que Cal tem uma doença terminal, mas conto nos dedos de uma mão quantas vezes eu já disse isso ao pai dela.
[...]
O que é tão diferente do ano passado é a forma como os médicos e enfermeiros recomendam medicamentos para ajudar minha filha ou sugerem procedimentos. Agora, há muito pouco de novo a tentar. Quando os médicos e enfermeiros olham Cal, eles nos perguntam o que queremos fazer; os truques para tornar as coisas melhores parecem ter a mesma eficácia de mudar as cadeiras de lugar no convés do Titanic que afunda. Cal estourou todas as dosagens de medicamentos e a única droga que restou na caixa de conforto é a morfina.
Que estranho é saber que tão pouco tempo resta. A morte, três anos e meio depois do diagnóstico, parecia tão longe quando um dos médico nos deu a sua previsão do tempo que restava a ela!
[...]
Disse coisas que nunca imaginei que seria capaz de dizer: a algumas pessoas, que estou com raiva e me sentindo traída por elas; a outras, que me sinto inundada de eterna gratidão e apreço. [...] Não há filtros entre meus pensamentos e palavras e ações. Não há tempo a perder com brincadeiras e diplomacia.
Há muita coisa a ser feita."
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Cal está morrendo; eu agora posso dizer isso e fazer planos para além desse momento. Tenho pensado sobre as escolhas que fizemos antes e discutido o que sinto sobre elas. Pat e eu tivemos uma conversa sobre o que está por vir e usamos a palavra começada por "m" para descrever o que está acontecendo. Pode-se imaginar que Pat e eu falamos sobre a morte de Cal às vezes, mas não. Consigo dizer a estranhos no telefone que Cal tem uma doença terminal, mas conto nos dedos de uma mão quantas vezes eu já disse isso ao pai dela.
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O que é tão diferente do ano passado é a forma como os médicos e enfermeiros recomendam medicamentos para ajudar minha filha ou sugerem procedimentos. Agora, há muito pouco de novo a tentar. Quando os médicos e enfermeiros olham Cal, eles nos perguntam o que queremos fazer; os truques para tornar as coisas melhores parecem ter a mesma eficácia de mudar as cadeiras de lugar no convés do Titanic que afunda. Cal estourou todas as dosagens de medicamentos e a única droga que restou na caixa de conforto é a morfina.
Que estranho é saber que tão pouco tempo resta. A morte, três anos e meio depois do diagnóstico, parecia tão longe quando um dos médico nos deu a sua previsão do tempo que restava a ela!
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Disse coisas que nunca imaginei que seria capaz de dizer: a algumas pessoas, que estou com raiva e me sentindo traída por elas; a outras, que me sinto inundada de eterna gratidão e apreço. [...] Não há filtros entre meus pensamentos e palavras e ações. Não há tempo a perder com brincadeiras e diplomacia.
Há muita coisa a ser feita."
***
Maria Kefalas é a mãe de Calliope, uma menina que nasceu com leucodistrofia metacromática (LDM) - um diagnóstico sem esperança: a maior parte dos pacientes não vive até os cinco anos. Aos 47 anos, ela quase largou sua cadeira na Universidade St. Joseph, onde leciona sociologia.
Ler o blog que Maria escreve é uma lição diária de como viver, se questionar, se descobrir falível e, ao mesmo tempo, forte o suficiente para apoiar a quem precisa. Menos do que os procedimentos por que passa sua filha, ela escreve sobre como nossas prioridades mudam; como errar e acertar; como se lamentar (ou se congratular) pelas escolhas feitas e encontrar novos caminhos a partir daí.
Conhecer toda a vida dessa mulher (desde o centro de estudos sobre violência juvenil que ela dirige, fundado pela universidade em memória de um estudante brilhante, morto estupidamente, até a perda do pai e o diagnóstico do marido, que luta contra um câncer) é antes de tudo aprender a lidar com as pequenezas que nos aborrecem e a manter as coisas sob perspectiva.
O que Maria ensina é a arte de viver.
http://
2 comentários:
É verdade, de fato é emocionante essa história. Vou acompanhar o site dela, obrigada pela indicação!
PS: Como andam você e as meninas? Tem muito tempo que não vejo nada novo aqui. Saudades das suas histórias. :) Beijos!
Saudades de ler voce. Quando puder, volte por favor.
Tata
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