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Sentada à mesa do café, estava conversando aquela prosa sonolenta de todos os dias com Zé Colméia. Então, mexendo a xícara de café e ouvindo-a contar uma história muito complicada sobre o castigo que uma amiguinha levou por ficar em prova final (sim, ainda existe isso) parei a colher no ar e olhei para cima, para minha filha. E foi como se eu a estivesse vendo pela primeira vez.
Ela falava e gesticulava. Os olhos grandes, o cabelo desgrenhado, os dedos finos nas mãos pequenas. Era a minha filha. E não era. O cadenciamento da voz mudou; agora ela fala meio que correndo, à moda dos adolescentes. As gírias estão ali, ainda empregadas de maneira tosca - são as colagens do que ela ouve da meia-irmã de 18 anos. O tom meio agressivo de quem se julga portadora de toda a sabedoria do mundo, a certeza sedimentada por longos 10 anos de vida. O rosto que está se afinando, a voz rascante que não se tornará redonda jamais. Era ela e não era.
É duro acordar pra vida assim.