segunda-feira, março 15, 2010
É tempo
Você nota instantaneamente que alguma coisa mudou. É como se aquele vermelho vivo, o furta-cor tão cafona e tão presente, é como se o amarelo, o rosa, o azul royal e o verde bandeira virassem lilás, bege, café, verde água. A adolescência não é berrante. É uma cor que morre lentamente nos olhos dos nossos filhos. É o calor que fica morno, é a luz vibrante que se torna suave. Eu vi o início do fim nos olhos da minha filha exatamente às 9h do dia 14 de março de 2010.
Exatamente nessa hora, nós duas deitadas na minha cama, Catatau ainda esparramada em seu sono domingueiro, que Zé Colméia aprendeu o que é sexo. O que é relação sexual, coito, gravidez, prazer. Aids, pedofilia. Um pouquinho por vez, satisfazendo as perguntas, saciando a curiosidade que há tempos martelava minha paciência com "Mãe, o que é transa?", "Mãe, o que é sexo?" "Mãe, o que é relação sexual?"
Eu expliquei. Miudinho, respondendo somente o que ela me perguntava. O queixo apoiado nas mãos, ela abria a boca a cada cena imaginada. "Então você transou com o papai? O vovô fez isso com a vovó? Com a vovó, mãe?"
E então eu vi. Aquela luz tão intensamente brilhante foi enfraquecendo aos poucos. Dando lugar a outro tipo de brilho, mortiço, cálido. Maduro. Alguma coisa morreu ali. E com ela morreu também um pedacinho de mim. E meu luto apareceu à noite, sozinha e enrodilhada na cama, chorando em silêncio ao lembrar do meu bebê gordinho que dormia sobre o meu ventre como se dele ainda não tivesse saído. O andar inseguro agarrando-se no meu dedo mínimo, o sorriso desdentado. Os desenhos tortos de círculos e rabiscos. Os vestidinhos rodados, os sapatinhos de feltro colorido cheio de apliques de abelhas e flores. Os guarda-chuvas de bolinhas, as sandalinhas de girassol.
Doeu muito. Ainda dói.
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4 comentários:
O parto sempre dói, né? E acaba de nascer uma mulher. É assim. Bjks.
Pense no bom que é tudo a seu tempo, com suavidade. E ela ouvindo tudo de você. É um luxo, acredite. Parabéns. E fique firme que tá só começando.
Beijos,
Rita
Cara, que texto lindo. Lindo, lindo, lindo. Chorei aqui. Quisera eu ter tido uma mãe como você, pra me contar isso tudo, pra me tirar as dúvidas e me deixar mais forte pra enfrentar o mundo, porque eu te digo, Su, você deixou a sua pequena muito mais forte ao mostrar a ela que pode confiar em você. Queria te dar um beijo agora.
Ui, como chorei aqui também... O que comentar? Nada. Estou apenas pensando se a "morte" não traz consigo uma espécie de renovação. Renove seu olhar para sua filha e, quem sabe? - essa nova etapa trará algumas delícias também...
P.S. Saudade de passar por aqui. Mulher, como vc escreve bem.
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